Pronunciava-se alguém na passada semana, num periódico local, sobre o falado novo modelo de avaliação do desempenho dos funcionários públicos. E negativamente, como que pasmado com "tamanha pretensão", com tamanho atentado ao trabalho dedicado e eficiente dos funcionários públicos! Esquecia-se, porém, que os funcionários públicos ganham em média mais vinte por cento que trabalhadores com qualificações idênticas no sector privado; esquecia-se que os funcionários públicos têm benefícios sociais, nomeadamente um sistema de reformas francamente injusto comparativamente com o do sector privado; esquecia-se que os funcionários públicos não têm medo de perder o lugar ao contrário do que acontece com o operário fabril ou o empregado de escritório (e por isso recordo aquela funcionária que no balcão da repartição tratava as pessoas como se gado fossem); não se lembrava que telefonou para o fórum TSF, durante o seu horário de trabalho, durante largos minutos, quando se falava em concertação social. E como ele dezenas de funcionários públicos telefonaram, e protestaram, e queixaram-se, e lamentaram-se. Esqueceram-se foi de dizer que o faziam do telefone do serviço e antes de terminar o período da manhã. Mas esta última questão é um
fait divers. E também é verdade que muitos funcionários trabalham exageradamente. Mas por isso são beneficiados, e estes sim, se calhar menos injustamente.
Certo é que não se pode esperar sol na eira e chuva no nabal. Contenhamo-nos senhores funcionários públicos, reflictamos e vejamos que continuamos consideravelmente beneficiados em relação aos restantes trabalhadores do sector privado. E não critiquemos aqueles que supostamente fogem ao pagamento rigoroso dos impostos. É que faríamos o mesmo não fora a malfadada sorte de o imposto nos ser logo deduzido. E depois não nos esqueçamos que muitos desses abusadores dos profissionais independentes e dos empresários lançaram-se no escuro, muitas vezes sem rede, correndo todo risco por conta própria. As instalações que usam, as secretárias, os computadores, os automóveis, os telefones, etc., são seus, não são do Estado. Não os invejemos, sejamos justos e comedidos, trabalhemos bem e não receemos o novo modelo de avaliação do desempenho dos funcionários públicos.
O desenvolvimento de um modelo de avaliação é condição essencial para a melhoria do funcionamento e do resultado da actividade. Fiquemos sorridentes, agradeçamos a sorte que tivemos por virmos aqui parar, demos graças por sermos funcionários públicos.
Eu se o fosse, era assim que pensava, lá do alto, instalado na segurança absoluta da minha cadeira de secretária e na certeza inabalável da minha reforma que mais dia menos dia chegaria, tivesse eu descontado mais ou menos, pois que alguém haveria de a pagar.
Tenhamos respeito. Tenhamos todos respeito por aqueles que estão muito pior que nós.